Só sei que nada sei, mas ainda insisto em digitar...

quarta-feira, 18 de julho de 2012

Só sei que viajarei.

"Um aviso à esses jovens, que têm cagado pela boca ao falar do filme ou do livro: Não importa quanta maconha vocês fumem, quanto uísque vocês bebam ou quanta benzedrina vocês usem - vocês nunca serão tão legais quanto esses caras foram."



Eu fui assistir "Na Estrada", que é o filme baseado no livro de Jack Kerouac. O marco inicial na "geração beat" ou "beatnik", como eles mesmos se intitulavam.

Eu não li a obra de Kerouac até agora, mas vou ler. De preferência em inglês. Cara, ao longo do tempo eu simplesmente parei de confiar em traduções. Aprendi isso na escola de Filosofia, e existe até uma cena no filme onde um personagem interpretado pelo Aragorn (Viggo Mortensen) alerta o jovem Sal Paradise sobre os perigos da tradução, e é uma cena muito boa.

Bom, o filme é muito bom, apesar de um pouco cansativo. São duas horas e lá vai caralhada de filme. Mas vale muito a pena assistir.



Sabe, eu fiz o meu colegial em escola pública. Ou seja, não aprendi porra nenhuma sobre a Literatura Brasileira, muito menos sobre Literatura Mundial. Fui conhecer os clássicos depois de formado. Mas confesso que conheci os beatniks apenas bem recentemente.

É bem interessante mergulhar naqueles Estados Unidos pelos idos de 1948, e tentar pensar como um jovem daquela época pensaria. Era o pós-II Guerra Mundial, e o mundo estava todo torto. Fisicamente e culturalmente. Eu vejo a vivência e as experiências vividas e criadas por esses jovens porra louca e inconsequentes (como Dean Moriarty ou a Marylou) como um grito de liberdade não apenas individual, mas um grito de liberdade em nome de uma sociedade. 

Uma sociedade que estava toda fodida, seja pelos resquícios da Guerra, seja pelos próprios tabus conservacionistas que a sociedade ainda insiste em ostentar como um pilar, quando na verdade vejo isso como um câncer, um tumor no meio da cara da sociedade.

Esses caras encheram a cara de álcool e drogas de todos os tipos. Uísque, maconha, anfetaminas, suor, saliva e fluídos vaginais de adolescentes americanas brancas, negras e de prostitutas mexicanas. Os homens E as mulheres. Respiraram tudo o que havia de mais tóxico, pois o que era "saudável" segundo a própria sociedade simplesmente sufocava e ainda sufoca almas como aquelas. Entorpeciam-se numa tentativa desesperada de ao menos tentarem raciocinar de forma mais clara em meio àquele caos social.



Uma cena em que Dean narra à Sal como ele viu uma jovem virgem branca americana e completamente "sugar aquela beleza de ébano de um jovem negro, e também a buceta peluda de uma jovem negra" é simplesmente a metáfora perfeita em busca de liberdade do jeito mais selvagem. Pois todos sabemos que na década de 40 era inaceitável que brancos e negros se misturassem, ainda mais os mais jovens. A jovem branca chapada que faz um boquete em um negro, e ainda cai de boca em sua amiga negra, é o CÚMULO do libertarismo (para aquele ser em específico, naquela época em específico). Cresceu ouvindo que deveria casar virgem, que mulheres não deveriam beber, que os negros não prestam, que não eram gente como a gente, e BANG!, a princesa virgem americana me vai lá completamente chapada e paga um boquete pro negão. Isso é poético, cara. É o tiro que sai pela culatra na cara da sociedade. Para não dizer outra coisa. 

Esse senso de liberdade, selvagem, é guiado e norteado pelos prazeres básicos, fisicos e psicológicos. Seja o prazer sexual, ou o prazer criado em nosso cérebro quando estimulados por uma droga qualquer. Esses jovens tinham tudo isso, eram bombas-relógio humana. E eles "explodiam, explodiam e explodiam como fogos de artífico no céu à noite."



E é incrível como o caos-químico-individual, em meio ao caos natural das coisas, pode simplesmente trazer momentos de sobriedade para certas pessoas. Ou senão isso, que todo esse caos químico transitório resulte em alguma ordem inexorável mais pra frente. É como se você aprendesse a dominar o caos de si mesmo primeiro, para depois tentar dominar o caos das coisas, o caos das pessoas, o caos do mundo. 

Eu não sei até que ponto estou viajando aqui, mas uma coisa afirmo à vocês: eu vejo jovens assistindo a geração beat de antigamente.

Não são jovens interessantes, reprimidos e pensadores como os jovens de outrora: são apenas jovens. Na pior acepção da palavra. 

São jovens babacas, criados pela avó, que aprenderam a fumar maconha ruim em seus colégios particulares com treze anos e a cheirar Pó Royal com quatorze. São meninos que tomam anabolizantes desde os dezesseis anos, e que vão à festas raves que duram dois dias e saem felizes (trincados) das mesmas sem terem comido ninguém. São meninas que perderam a virgindade com um merda qualquer cedo demais, e agora tiram a roupa em praça pública em nome de qualquer causa política de merda.



A questão é que jovens assim têm assistido o filme como uma ode ao hedonismo, pois afinal, essa é a rotina que eles próprios vivem. É simplesmente não conseguir entender que uma suruba era praticamente um ritual, ou um ato político. Tinha significado de alma. Eram espíritos livres em busca de viver e pensar. E não me dou ao direito de julgá-los pelo fato de que, para que essa libertação ocorresse de fato, precisavam fumar maconha, beber uísque pra caralho ou tomar benzedrina como se fosse sobremesa.

Prestando atenção na história, não absorvemos apenas putaria e jazz (e jazz DO BOM). Absorvemos processos de libertação. Absorvemos que a liberdade pode custar caro, e que você precisa aprender a lidar com ela, uma vez que a adquiriu em um processo de libertação qualquer. E os personagens lidam com isso, e assumem as consequências.

Diferente da juventude que vê apenas uma história hedonista e vazia de putaria, vagabundagem e drogadição. Os meios podem ser parecidos, mas não os fins. Esses caras tinham um fim específico, que talvez nem eles mesmos soubessem. Eles estavam lutando por algo. Diferente de vocês. Pois vocês apenas banalizam a liberdade que já têm desde o berço.

Até onde eu me lembro, Sal Paradise caía pra dentro da putaria e completamente chapado. Mas colheu algodão de sol-a-sol e carregou sacos de açúcar no lombo feito um animal. Entendem o que eu quero dizer? Se entendem, ótimo. Se não entendem, espero que um dia entendam. Mas bem longe de mim.



Um aviso à esses jovens, que têm cagado pela boca ao falar do filme ou do livro: Não importa quanta maconha vocês fumem, quanto uísque vocês bebam ou quanta benzedrina vocês usem - vocês nunca serão tão legais quanto esses caras foram.

E em breve, é minha vez de cair na estrada. 

Boa sorte pra mim.

Beijos à todos.

4 comentários:

  1. Bravoooo !!! um ensaio real e puramente honesto, que Os DEUSES tenham piedade para com essa gente careta e tão covarde !!! ...A estrada te espera caro amigo !
    Deivis.J.F.Coelho.

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  2. Você nunca vai aprender a usar crase corretamente? Boas reflexões. Déficit de amor. Boa sorte, boa viagem. Eu.

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  3. Hopefully your trip will be a little less filled with drugs and random atempts of "self liberation". Adoro este livro e, embora não tenha assistido ao filme, imagino que a distorção tenha sido bem grande, com foco para o hedonismo e ponto. Porque, como você bem disse, é o que nossa geração tá vivendo e nada mais importa além de ir pra balada, trepar, e gozar a vida (literalmente ou simbolicamente).

    A geração beatnik tinha um contexto, um cenário social que está longe do que vivemos hoje. Pra gente, já está tudo liberado, e nada mais é tabu. Então, já seria a hora de nossas viagens serem menos regadas a substâncias e mais concretas. Claro, isso na minha humilde opinião.

    e avisa aí a hora que você começar a cantar "start spreading the news..." o/

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  4. Oi Mari! Nossa, eu realmente pensei que você tinha sido abduzida, assassinada ou algo do tipo! Mas aí lembrei tua relação bipolar com as redes sociais e programas de troca de mensagem instantânea e fiquei um pouco mais tranquilizado, hahaha como você está Eu vou fazer minha despedida aqui em Santos dia 23/08, aqui no Cheers Pub. A Carly até trabalha lá de hostess agora. Eu viajo dia 01/09. Mantenha contato comigo, porra. Tenho tanta coisa pra contar! Qual teu e-mail? O meu é: tayan.malantrucco@hotmail.com BEEEIJO!

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