Só sei que nada sei, mas ainda insisto em digitar...

quinta-feira, 20 de outubro de 2011

Só sei que não cumprimentei.

"Nesse ínterim, nossos olhares às vezes se cruzavam, às vezes por longos e intermináveis segundos. Os olhares se cruzavam quase que se desculpando pelo fato do mundo ser mundo."



Hello, stranger!

Esses dias eu bolava a aula de Processo Civil na faculdade em um dos seus pátios, em um dos seu bancos. Sentado, em uma manhã fria, em um dos bancos da vida. Eram 7h30 da manhã mais ou menos, chovia fino e ventava gelado. Eu refletia sobre a vida e a morte lendo algumas crônicas espíritas, quando uma moça se aproximou.

Não era linda. Era bonita. Nem gorda, nem magra. Mancava. Aquilo me intrigou. Seria deficiente? Estaria machucada? Torceu o tornozelo na infância e nunca mais se recuperou? Ou o torceu durante sua jornada à pé, à caminho da faculdade? Ela sentou-se. Fiquei muito curioso!

Nossos olhares se cruzaram. Senti vontade de cumprimentá-la. Não cumprimentá-la como homem, mas como pessoa. Dar um "oi". Afinal, quem é aquela pessoa? Qual é a sua história? Afinal todo mundo tem uma. Mas...não o fiz.

Não é timidez. De verdade (quem me conhece sabe)! E enquanto eu lia o livro, eu simplesmente sentia que ela me observava, e às vezes, de rabo de olho, eu a observava também. Nesse ínterim, nossos olhares às vezes se cruzavam, às vezes por longos e intermináveis segundos. Os olhares se cruzavam quase que se desculpando pelo fato do mundo ser mundo.

Havia uma tensão ali, de fato. Mas não era uma tensão sexual. Se fosse uma tensão meramente sexual, talvez o meu lado macho-alfa tivesse eclodido e eu tivesse começado a dar descaradamente em cima dela, mas não! Era algo diferente, uma tensão apenas humana. Comecei então a refletir, e a reparar em tudo naquela situação que tanto me incomodava.

Reparei que naquela gélida manhã, eu havia sentado na ponta de um último banco (em uma fileira de muitos) e estrategicamente havia posicionado meu guarda-chuva e meu caderno na ponta, do outro lado do banco. Precisão militar. Lá estava eu, no meu "forte", dentro da minha barreira, da fortaleza que eu mesmo havia criado. Era como se eu tivesse ali colocado um aviso que dissesse "Qualquer um que ousar se aproximar deste ser-humano que aqui se encontra, neste banco, será VIOLENTAMENTE IGNORADO"! E lá eu me encontrava em meu castelo de papel e guarda-chuva, observando tudo e todos, como se fosse uma espécie de sentinela carrancudo e ou de um déspota sanguinário. Que vergonha! Que feio!

Até pensei em abrir a minha fortaleza e me dirigir humildemente até à ela, mas o meu orgulho e covardia-social me impediram. Fiquei a matutar: "Se essa pessoa pensar como eu, com certeza muito gostoso será o nosso diálogo. Mas e se não pensar? Afinal, todo mundo anda assustado com todo mundo hoje em dia. Assustado, cabreiro. E se essa pessoa estiver em um momento introspectivo e simplesmente QUEIRA estar sozinha? Ela pode estar me olhando não porque ela quer conversar, apenas porque eu olhei pra ela primeiro. Estaria eu sendo inconveniente? Prefiro não arriscar." E não arrisquei mesmo.

E não adianta nem eu reclamar, pois eu mesmo, inconscientemente, faço isso. Cercado e protegido pelos sinais e pelas barreiras que eu mesmo havia projetado e construído em um nível inconsciente.

Forrest Gump era mesmo corajoso em toda sua pureza! Ou talvez o puro não seja corajoso, pois não há o que enfrentar. Pois o puro, simplesmente, é.

Sabe, eu gostaria de viver em um mundo onde as pessoas possam se cumprimentar livremente, sem malícia e sem julgamentos pelo simples fato de cumprimentar ou ser cumprimentado.

Nem digo que eu espero viver em um mundo assim, pois devido ao atual contexto social, acho bem difícil que isso aconteça antes que eu vá dessa para a melhor (pior?). Mas pelo menos estudar, trabalhar e me dedicar para que tanto eu quanto vocês (ou nossos filhos e os filhos deles) possamos viver em um mundo onde daremos "oi" para os estranhos que se aproximam nos momentos de aleatoriedade (ou não) da vida.

Então um estranho não será mais um estranho. Será um amigo. Ou um inimigo. Mas um estranho? Nunca mais!

Bye, stranger!

*Crônica escrita no pátio da Universidade Santa Cecília em Santos/SP, no próprio caderno mencionado no texto, enquanto a cena descrita acontecia

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